Hoje falaremos um pouco sobre ouvintes ativos e passivos e sua influência nas carreiras dos artistas e na produção musical.
Para começar, devo explicar o que entendo como ouvinte ativo e passivo. Para mim, ouvinte ativo é aquele que escolhe especificamente o artista ou a música que deseja ouvir, e ouvinte passivo é aquele que ouve o que lhe é fornecido por uma estação de rádio, música ambiente, trilha sonora de uma novela, playlist pública etc.
No passado, a objetivo da gravadora era o ouvinte ativo, que comprava na loja de discos as músicas de seus artistas favoritos. Não havia preocupação em obter lucro direto com o ouvinte passivo, a ideia era convertê-lo em ouvinte ativo; ou seja, aquele que ouve uma canção, por exemplo, no rádio, e em seguida compra o disco respectivo. Por isso as gravadoras nunca se preocuparam muito com a cobrança de direitos pelas execuções (ao contrário, muitas vezes pagavam às rádios para que as músicas fossem tocadas, uma prática conhecida como "jabá"). Também por isso, não se preocupavam muito com as questões de direitos autorais e direitos conexos, contentavam-se com uma legislação que só lhe reservava cerca de 20% do valor pago pelas emissoras à associação arrecadadora de direitos sobre os fonogramas (modelo europeu de distribuição, que privilegia o autor da música e ainda vigente nas rádios brasileiras). Na venda do disco, não existia nada disso, o disco era propriedade da gravadora e o pagamento aos compositores, intérpretes e músicos era por ela estabelecido à sua vontade.
Pelo parágrafo acima, é fácil compreender a devastação causada nas gravadoras pelo desaparecimento quase completo das mídias musicais físicas, assunto que abordamos em nossa postagem anterior. Hoje buscaremos observar este panorama pela ótica dos artistas.
O cantor ou cantora não dependia da venda de mídia física para sobreviver. Mesmo que o contrato com a gravadora fosse parcela importante de sua renda, havia a possibilidade de se apresentar ao vivo. Para ele, a redução dos custos da produção de um fonograma e a facilidade de divulgação trazida pela Internet trouxe o lado benéfico de lhe proporcionar maior independência no gerenciamento de sua carreira. O outro lado da moeda foi o aumento da concorrência, pela entrada no mercado de uma multidão de artistas que não mais precisavam passar pelo crivo de uma gravadora.
Outro ponto importante foi a chegada das plataformas de música. Se o rádio sempre foi em linhas gerais e tradicionalmente um pagador difícil, a ponto de justificar o surgimento de associações arrecadadoras para defender os direitos autorais e conexos de seus artistas associados, a Internet era uma pagadora mais confiável. A distribuição dos direitos autorais e conexos não é a mesma da ECAD, usa-se o modelo norte-americano, que privilegia o produtor e diminui a porcentagem de autores e intérpretes, mas para o artista que é produtor independente isto não representa problema. O desafio é conseguir ser ouvido, pois o pagamento por reprodução é ínfimo, e só aquele que atinge a ordem de grandeza de milhões de reproduções consegue uma receita significativa.
E aqui chamamos a atenção para a inversão de papéis provocada por este panorama: para o produtor musical de hoje, o ouvinte passivo ganhou importância sobre o ouvinte ativo. Ele precisa buscar a inclusão de suas obras em playlists de acesso público, pois só assim poderá almejar a ordem de grandeza de milhões de reproduções de seus fonogramas. Hoje, cada vez mais é importante o apoio recíproco entre artistas e produtores independentes no sentido de formar suas tribos de seguidores, já que ninguém é ouvinte de um só artista. Este é o caminho, na minha modesta opinião. Mas, como sempre, aceito réplicas e opiniões contrárias. Obrigado, leitor!







